Nas últimas décadas, a confiança pública nos media e nas instituições informativas sofreu um abalo profundo. A ascensão das plataformas digitais não apenas facilitou o acesso à informação, como também abriu caminho a uma nova desordem informacional (feita de rumores, teorias da conspiração, manipulações calculadas e meias-verdades). Neste cenário, o fact-checking surgiu como uma tentativa de resposta. Uma tentativa de reocupar o terreno da verdade factual num espaço cada vez mais marcado pela disputa e pela saturação.

Mas o que sabemos realmente sobre a eficácia do fact-checking? Será que corrige de facto perceções erradas? Quem o consome? Quem o rejeita? E com que critérios julgamos a sua autoridade? Apesar da sua crescente presença no debate público e no jornalismo contemporâneo, o fact-checking permanece uma prática pouco compreendida e, muitas vezes, idealizada.

O projeto aPEaSE – Verificar os Verificadores de Factos: práticas e eficácia no sul da Europa é financiado pela FCT e parte precisamente desta inquietação. O nosso ponto de partida é simples: se o fact-checking se tornou um dos instrumentos centrais de combate à desinformação, então é fundamental compreender em que condições essa promessa se cumpre e quando, pelo contrário, falha ou produz efeitos inesperados.

Ao longo de dezoito meses, estudaremos as principais iniciativas de fact-checking em Portugal, Espanha e Itália, com particular atenção à forma como estas práticas são construídas, distribuídas e recebidas pelos públicos. O projeto combina observação direta, entrevistas e inquéritos populacionais. Procuramos articular estas dimensões com a análise computacional das redes de circulação digital. O nosso objetivo não é apenas avaliar o desempenho de cada projeto, mas compreender os fatores que moldam o impacto do fact-checking.

Porque se existe hoje um consenso sobre a ameaça que a desinformação representa, permanece em aberto o debate sobre as melhores formas de enfrentá-la. Estudar o fact-checking é, nesse sentido, muito mais do que avaliar um formato jornalístico. Este projeto existe para lançar perguntas, produzir dados, mas também para abrir espaço ao escrutínio. Porque a verdade, mais do que nunca, precisa ser construída em comum e a sua defesa exige não só convicção, mas método e crítica.

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